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sábado, 26 de junho de 2010

Menina-Dor


Meus olhos rasos
Assombrados de medo
Janelas fechadas
Meus segredos de dor.

Meus pés feridos
Dos sapatos altos
Demais prá minha pouca vida
Meus dedos martelados.

Meu espaço restrito
Meu grito calado
Meu sonho morto
Antes de sonhar.

Meu caminho desfeito
Antes de caminhar
Meu íntimo querer
Devassado
A minha casa
A sede da alma.

Minha infância adulterada
Minha essência forjada
No desencanto e na dor.
Meu álbum de desenhos
Recortes dolorosos
São rosas negras
Espinhosas.

Bocas de raiva
Medonhas
Dentes trincados
Tristonhas borboletas.

Ao fundo, ao lado
Ao largo das suas consciências,
Meu sinal, meu aviso:
Vejam-me
Pois eu sou na flor solitária
Na árvore solitária
Menina-dor.

Sandra Fonseca
Belo Horizonte, 26/06/10


À "Lótus", 12 anos,vítima de abuso sexual, entre os 8 e 11 anos, pelo padrinho.

Nota: Nunca ousei escrever pela via da poesia, a experiência de atender meninos e meninas violentados. É uma dor tão palpável, insidiosa, que eu supunha não haver um “ corpus” de palavras poéticas que a rescontruísse ou que a nomeasse. Dor que se testemunha, e que não se cura. Dor que se impõe na fragilidade das mãos trêmulas e pequenas, que se mostra inteira num pedaço de desenho, na flor solitária no canto do papel, nas borboletas tristonhas.

É preciso enxergar. Urge acordar o adulto que protege e educa. Há que se comover, sem se paralisar na comoção, mas agir. Salvaguardar os direitos de crianças e adolescentes é obrigação de cada um e de toda uma sociedade.

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